A PUC-SP, instituição dedicada ao ensino, à pesquisa e à extensão, é uma universidade particular confessional, que tem como forte marca o caráter comunitário e filantrópico, enquanto está ligada a um grupo social que aceita a inspiração da tradição humanístico-cristã da igreja católica e, ainda, é concebida com uma instituição prestadora de serviço de interesse público. Podemos tomá-la, portanto, como uma universidade que indica uma educação que tem por objetivo o ensino, o desenvolvimento de pesquisa e extensão como praticas voltadas para a sociedade. Isso posto, fica a pergunta: qual é o papel dos alunos, professores e funcionários dentro da comunidade? Como as instituições privadas do ensino superior tem se adaptado às necessidades do Programa Universidade Para Todos - ProUni?
Com a crescente entrada de estudantes de baixa renda na PUC-SP, constatou-se uma dificuldade no acesso e permanência dos alunos nos cursos de graduação, onde sequer existe um acompanhamento específico desses, que são a classe-que-vive-do-trabalho. A condição de pobreza, e a falta de alimento por longos períodos podem sinalizar a necessidade de atendimento emergencial, pois, apesar de frequentar o curso, muitos alunos não possuem as condições ideais para acompanhar a graduação.
No Rio de Janeiro, a PUC-Rio já entendia a questão da fome, das dificuldades no transporte e com o material escolar como um dos fatores determinantes para a criação do FESP - Fundo Emergencial de Solidariedade da PUC-Rio, cuja experiência só foi possível graças a solidariedade existente entre funcionários, professores e alunos. Apesar de ninguém saber direito como dar transporte e alimentação, uma coisa era óbvia: a motivação fundante do FESP era dar condições para que os alunos pudessem desenvolver seu próprio projeto de vida universitária, através da organização da distribuição dos auxílios, reuniões com os alunos, e atendimentos individuais feita por uma equipe especializada.
A solidariedade, portanto, é um fator crucial para o atendimento das demandas mais emergenciais, sendo aqui compreendida como um meio para criar uma ordem social na qual cada individuo pode participar integralmente das possibilidades colocadas e pelas relações sociais marcadas pelo sentimento comum e do bem comum, tendo por objetivo final a educação. Nesse sentido, podemos considerar a criação de um fundo social como um direito constitucional à assistência social, mas não devemos confundi-lo como um programa assistencialista. Muito pelo contrário. Assistencialismo é o contraponto da assistência social, na medida em que cria dependência e impossibilita a emancipação, pois não visa à uma ação coletiva de enfrentamento na raiz de uma questão que se impõe no dia-a-dia.
O ProUni, enquanto programa do governo federal, em que o candidato é selecionado de acordo com a pontuação que obteve na prova do Enem, é considerado por muitos pesquisadores como um programa neoliberal relacionado à meritocracia individual, onde os aprovados que ingressam na universidade não pertencem, na maioria das vezes, a um grupo comum cuja identidade já existia antes do ingresso na instituição de ensino. Ao contrário, muitos estudantes do ProUni vem de outras cidades ou de diferentes estados do país, sem referência ou redes sociais estabelecidas que facilitem a sua integração na universidade. Nesse caso, podemos dizer que uma das coisas mais importantes para qualquer sistema educacional, especificamente, é o sistema das redes de solidariedade, que, além de firmar o sistema de cotas, alimentação, auxílios, materiais, etc, também garante que nenhum estudante fique abandonado. Nessa linha, destaca-se os alunos oriundos de cursinhos comunitários, que são jovens que vem de um lugar onde criam laços e redes de solidariedade (ou apoio) que se fortalecem durante o período universitário. Muitos destes se tornam fortemente engajados em importantes causas sociais, tornando-se agentes políticos de transformação e interação dentro da universidade. É graças a alguns desses alunos, que a criação do Projeto Universitário de Suporte ao Estudante - ProUni-SE!, por exemplo, vem cada vez mais se consolidando.
A rede de solidariedade iniciada com os alunos envolvidos com o ProUni-SE!, no começo contavam apenas com alguns poucos estudantes de poucos cursos preocupados em pedir transferências de turno, fazer o bacharelado, monitorias, DPs, dentre outras coisas. Posteriormente, pessoas de outros cursos começaram a aparecer, e a troca de informação e conhecimento aumentou, daí, através da realização de um abaixo assinado, os alunos garantiram o direito de ter a própria voz representada dentro da comissão responsável pelo acompanhamento e fiscalização de bolsas. Hoje, o ProUni-SE! conta com mais de 600 pessoas em um grupo virtual, trocando informações, oportunidades e conhecendo verdadeiros amigos em uma rede criativa que projeta ações dentro e fora da universidade com a perspectiva de cada vez mais conectar mais pessoas que trabalham, estudam e fazem parte desse emaranhado de relações sociais que transitam entre o mundo e a universidade.
Em suma, a partir da criação de redes de solidariedade dentro da universidade, sobretudo, entre estudantes, professores e as pessoas que compõe os departamentos responsáveis pela manutenção da instituição, é possível o surgimento de novos horizontes possíveis para as redes sociais existentes nesse espaço de troca de conhecimento e experiência acadêmica. Cabe a comunidade, como um todo, enxergar-se nesse emaranhado de relações entre pessoas, responsabilizando-se pela consciência coletiva que é produzida ali dentro. Se existe exclusão, segregação, ou um tremendo descaso com as pessoas mais vulneráveis dentro da universidade, tal situação é em decorrência de uma cultura que ainda não amadureceu o suficiente para incorporar os complexos processos sociais a que estão submetidos. Sendo assim, devemos enxergar nas iniciativas autônomas, como o desenvolvimento de um fundo social, de cursinhos populares e projetos comunitários, através da livre conversação, sem hierarquias e sem burocracias desnecessárias, como a possibilidade de se trilhar por um caminho mais desenvolvido para a sociabilidade dentro do campus, através de uma consolidada rede de relações solidárias e de apoio mútuo.
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